É inegável que o que deve atrair muitas pessoas para A História do Som é a presença de dois dos atores mais comentados da nova geração: Josh O’Connor, conhecido por Rivais (2024) e o sensível Reino de Deus (2017), e Paul Mescal, destaque em Todos Nós Desconhecidos (2023) e na série Normal People (2020), formam aqui uma dupla que desperta grande expectativa — especialmente entre uma parcela do público queer, que recebeu com entusiasmo o anúncio do novo filme de Oliver Hermanus (Living). Exibido na 49ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, o longa prometia unir emoção e delicadeza, mas o resultado, embora belo, é marcado por uma contenção que limita o que poderia ter sido um romance arrebatador.
Em A História do Som, o diretor busca transformar a música em ponte entre dois homens que se descobrem através dela. Lionel (Paul Mescal), jovem estudante de música, e David (Josh O’Connor), cantor carismático, se conhecem no Conservatório de Boston em 1917. Anos depois, uma carta os reúne em uma viagem pelo interior do Maine para coletar canções populares. A jornada promete ser um mergulho na tradição musical americana e, ao mesmo tempo, na emoção de um amor que nasce entre eles.
Mas o que poderia ser uma grande história sobre o poder do som e do silêncio acaba soando excessivamente controlado. O filme tem beleza, melancolia e um cuidado formal evidente, mas falta-lhe intensidade. Paul Mescal e Josh O’Connor entregam performances delicadas, quase coreografadas, mas o diretor parece sempre filmá-los com uma frieza exagerada, fazendo com que seus enquadramentos nos poupem da intensidade que os dois poderiam alcançar juntos. Esse sentimento parece enclausurado, sufocado por uma mise-en-scène que evita qualquer gesto de desejo ou conflito mais carnal, tratando a relação homoafetiva com um conservadorismo excessivo.
Há um esforço visível para que tudo permaneça discreto, sutil, quase etéreo, uma escolha que acaba minando a força da história e desse amor tão genuíno, que é possível perceber através do olhar dos dois atores, excelentes em cena. A música, que deveria servir como linguagem de conexão entre os personagens, surge em momentos pontuais sem corresponder à promessa da sequência de abertura, na qual um jovem Lionel fala sobre os sabores e cheiros que as notas lhe transmitem. Claro, é impossível que o filme faça o mesmo com a audiência — seria incrível um filme que exalasse aromas —; ainda assim, Oliver Hermanus não consegue com que o som comunique o que o olhar e o toque não podem dizer.
Visualmente, A História do Som impressiona com as paisagens áridas do Maine, que constroem uma atmosfera de isolamento e introspecção, espelhando o distanciamento emocional dos protagonistas. No entanto, essa estética de contenção se prolonga além da medida — e o que começa como sensibilidade logo se transforma em frieza. Há uma melancolia bonita ali, mas ela soa calculada, quase coreografada, como se cada silêncio fosse meticulosamente imposto para que o público sofra por um sentimento que existe, mas nunca se torna verdadeiramente palpável. É como negar o doce a uma criança. O pior: o doce está logo ali aos nossos olhos.
No fim, A História do Som escuta mais o silêncio do que a música como elo desse amor proposto. É belo, cuidadoso e sensível em certa medida, sim, mas também tão contido que a emoção nunca chega a se concretizar na tela. O talento de Paul Mescal e Josh O’Connor é evidente, mas isolados e reservados não conseguem aquecer esse romance. Resta, assim, um drama de época elegante, visualmente marcante e melancólico, mas frustrante — um longa que prefere observar o sentimento de longe em vez de vivê-lo, deixando o público mais espectador — e na expectativa — do que envolvido.
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