Foi da atitude do rap, da ousadia do funk mandela e da criatividade da moda que a paulista NandaTsunami (nascida Fernanda Xavier Ferreira Santana) começou a construir sua trajetória na música. Em julho de 2025, ela lançou seu disco de estreia, É Disso Que Eu Me Alimento, após fazer experimentações no EP/mixtape Tsunami Season.
Em entrevista à Rolling Stone Brasil, a artista revelou que seu nome artístico vem de “se eles tiram onda, eu tiro tsunami”, verso da música “Angra Dos Reis”, de Mc Daleste, funkeiro que fez sucesso nos anos 2010 e foi morto em 7 de julho de 2013 após ser baleado durante show.
Foi pela 25 de março, centro de São Paulo, que Nanda iniciou sua vida na indústria fonográfica. Sempre gostou de bijuterias e de música e, lá pelos 19 anos, uniu o útil ao agradável quando começou a fazer joias para artistas, como Ajuliacosta, usarem em videoclipes e nos shows.
“Fui conhecendo essa galera da música até que comecei a ver isso, talvez, como uma oportunidade de me expressar”, disse a cantora, que hoje tem 25 anos. Apesar de ter dado uma sequência rápida aos seus lançamentos e já acumular 3 milhões de reproduções nas plataformas digitais com É Disso Que Eu Me Alimento, NandaTsunami via uma carreira musical como algo distante.
“Na minha cabeça, como eu não sabia cantar, parecia algo que eu não poderia fazer e eu não entendia, não me via tendo esse porte para ser rapper”, explicou à Rolling Stone Brasil. “O rap é um estilo que fala muito sobre autoestima, que você precisa ter. Como eu ainda não tinha construído essa autoestima, para mim parecia muito distante. Eu gostava de arte, mas era sempre mais conservador, então eu escrevia, mas eu não achava que seria algo que daria para fazer música, por exemplo”.
Então, isolada em casa durante a pandemia de Covid-19, Nanda começou a trabalhar em beats e tentar encaixar alguma frase ou verso que compusera. Com a criatividade fluindo, ela conseguiu ver valor naquilo que fazia e, finalmente, investiu na sua carreira, que já tem dado frutos.
Abaixo, leia a entrevista de NandaTsunami à Rolling Stone Brasil:
E como o funk dialoga com sua carreira no rap?
O funk é algo que eu conheci mais na rua, não era um som que eu podia ouvir dentro de casa, mas sempre fez parte da minha vida. Vejo no funk uma linguagem que me agrada. Por exemplo, escuto muito mais funk mandela do que funk consciente. Sempre penso que você precisa ser muito inteligente para escrever música de putaria e fazer isso soar legal. O funk tem essa ousadia, esse espírito de contracultura e de ser diferente do que as pessoas esperam, e isso me atrai. Gosto de gente falando coisas ousadas.
Passei a adolescência ouvindo muito MC Daleste, mas quem me trouxe bastante dessa influência foi a MC Marcelly, porque ela era uma mulher que cantava putaria — Valesca Popozuda também. Era diferente, porque eu estava acostumada a ver Manu Gavassi no mainstream. O funk me mostrava esse outro lado: a ousadia de dizer coisas para as quais a sociedade talvez não estivesse preparada.
E como você construiu sua autoestima para começar a carreira na música?
É parecido com essa questão do funk. Eu não me via como alguém que poderia fazer rap, porque não era a pessoa que colava em batalha de rima nem vivia só de rap; eu também gostava de pop e de funk. Meus gostos sempre foram plurais e eu sentia que não me encaixava em nenhum desses lugares. Isso me fazia pensar: “Será que eu posso mesmo fazer parte dessa parada?” Eu não me achava “tão rap”, aquela garota de rua, nem funkeira. Ficava nesse dilema.
O processo de construção da autoestima veio das minhas vivências. Precisei passar por várias experiências na adolescência e na vida pessoal que me ajudaram a me fortalecer. A espiritualidade também foi fundamental, porque a criatividade — essa habilidade de expressar as coisas de forma criativa — é muito ligada a ela.
Quanto mais me conheço, mais mergulho em mim e entendo o que preciso dizer e fazer. Antes eu não tinha tanta clareza: até compunha algumas músicas, mas sentia que não combinavam comigo. Hoje tenho uma percepção diferente, porque sei o que gosto e o que quero criar.
Sua carreira chega em um momento em que as mulheres no rap estão em grande evidência. Tasha & Tracie na capa da Capricho, Duquesa dominando a cena, Ebony lançando o KM2, Ajuliacosta ganhando o BET… Como você analisa a atual cena do hip hop brasileiro?
Vejo o rap feminino como algo muito plural. Cada artista tem seu espaço e cumpre papéis diferentes. Sinto que o rap feminino tem sido essencial para popularizar o gênero no Brasil.
Talvez algumas pessoas, em algum momento, tenham dificuldade de se conectar com o rap, mas as artistas mulheres trazem assuntos diversos. O álbum KM2, da Ebony, por exemplo, aborda vários temas, e muita gente se identifica com o que ela diz. Esse autoconhecimento que cada uma coloca na música cria conexões com o público.
Isso é importante para o crescimento do rap, porque as pessoas se cansam de ouvir sempre a mesma fórmula. As minas chegam inovando, trazendo coisas novas e músicas reais.

Ano passado você lançou Tsunami Season, com sete faixas. Como foi realizar esse trabalho?
Ele tem mais o formato de um EP. Eu já tinha “4 Horas” e “Novinho Chora”, mas, em Tsunami Season, quis experimentar. Eu pensava: “Não faço só funk, mas também não quero ficar apenas no trap. O que dá para criar misturando tudo isso?” Foi um momento de descobrimento e autoconhecimento, de entender o que é o feminino.
Vejo esse projeto como meu primeiro ato de autodescoberta. Para os artistas, cada trabalho é como uma temporada da vida. Esse foi meu primeiro olhar mais profundo para dentro de mim, ainda que de forma inicial.
Em julho você lançou o disco É Disso Que Eu Me Alimento. Como foi a construção desse trabalho?
Ele nasceu enquanto eu passava por um processo espiritual e tentava entender como trazer isso para minha vida e minha arte. Esses processos costumam ter começo, meio e fim: primeiro você entende o que está acontecendo, depois atravessa o processo e, por fim, percebe que vai ficar tudo bem. Quis que o álbum tivesse essa estrutura, mas só percebi isso no meio da criação.
A primeira faixa que escrevi foi “Solta”, e ali entendi que estava lidando com sentimentos de rejeição. Comecei a me perguntar: “Por que tantas músicas de amor falam sobre rejeição? Por que isso é quase universal?” A partir daí, trabalhei a ideia do disco, investigando como a gente age quando se apaixona e quando é rejeitado.
Exatamente, do que você se alimenta?
Do amor, dos afetos, das dores e das memórias — de tudo que me faz sentir viva.
Qual foi seu propósito com este disco?
Queria expressar coisas que estavam guardadas no meu coração e permitir que quem escutasse se desse a chance de sentir, refletir e, a partir disso, se curar.
As letras falam muito de amor, mas também priorizam seus sentimentos e uma autorrealização. Como chegou a isso?
Acho que pelo autoconhecimento. Tenho exercitado transformar em letra o que aprendo com a vida, para entender melhor o que se passa na minha cabeça. Terapia, conversas com amigas e o hábito de escrever um diário me ajudaram bastante.
Como você pretende trabalhar nesta nova fase da carreira?
Do mesmo jeito que no processo criativo do álbum: com presença e consciência, prestando atenção no que sinto e no que acontece ao meu redor. Li em um livro que a arte de se deleitar vem do dom de prestar atenção — e é isso que quero, prestar atenção em cada detalhe para aproveitar ao máximo.
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