Quando o Little Mix anunciou uma pausa por tempo indeterminado em dezembro de 2021, após uma década de sucessos globais, muitos se perguntavam o que viria a seguir para suas integrantes. Para Jade Thirlwall, a resposta chegou de forma gradual, mas determinada: THAT’S SHOWBIZ BABY!, seu álbum de estreia solo que representa muito mais que uma simples mudança de carreira, é uma verdadeira reinvenção artística e pessoal onde ela finalmente encontrou sua voz individual após mais de dez anos como integrante de um trio.
O primeiro vislumbre dessa nova fase veio de forma inesperada. Em agosto de 2024, nem os fãs mais atentos notaram que no videoclipe de “Starburster” da banda irlandesa Fontaines D.C., aparecia de fundo uma figura familiar… era Jade, em sua primeira aparição como artista solo, discretamente integrada ao universo visual da faixa. A colaboração, dirigida por Aube Perrie, criou um crossover que unia mundos musicais aparentemente distintos, sinalizando a abertura artística que definiria sua nova jornada.
(Você consegue achar?)
Meses depois, em outubro, Jade oficializou sua carreira solo com “Angel of My Dreams”, um single que imediatamente estabeleceu seu novo território sonoro, mais experimental, visceral e profundamente pessoal que qualquer coisa que havia feito anteriormente. O videoclipe, em que acontece o crossover com o universo do Fontaines D.C., é uma produção extravagante que mistura referências visuais sofisticadas com uma narrativa onírica, e serviu como um statement do que estava por vir.
“Fantasy”, lançado em seguida, consolidou essa estética com a parceria de David LaChapelle, lenda da fotografia e direção que não fazia um videoclipe há oito anos. A colaboração resultou em uma peça visual que mescla referências de horror (especificamente Carrie) com elementos de Soul Train e disco, tudo banhado pela iluminação característica de LaChapelle.
Agora, aos 32 anos, Jade apresenta THAT’S SHOWBIZ BABY!, um álbum que funciona como carta de amor e ódio complexa à indústria que a formou, explorando tanto suas glórias quanto suas cicatrizes com uma honestidade brutal que ela nunca teve liberdade para expressar antes.
A coragem de voar solo
Como foi voltar à sua voz individual depois de uma década fazendo música em grupo?
“Foi uma grande mudança para mim. Passei mais de 10 anos em um grupo de garotas, e isso significou me acostumar a nunca fazer minhas próprias decisões. Criativamente, sempre foi um esforço de grupo”, confessa Jade.
O processo de adaptação foi gradual e revelador: “Mesmo apenas praticando, eu me sentia tipo ‘vou cantar uma música inteira agora, sobre mim, e sobre mim, e tudo isso”. Mas o resultado a surpreendeu: “Até me surpreendi com o que posso fazer sozinha”.
Uma nova era de aceitação
Como você se sente sobre a mudança nas reações dos fãs às transições de grupos musicais?
Jade observa uma transformação significativa na forma como o público recebe mudanças de carreira de artistas vindos de grupos. “Antes era um tipo de lamento dessa mudança, e agora é tipo ‘legal, nós temos mais coisas para abraçar’”, explica.
A artista credita parte dessa receptividade ao modo como o Little Mix encerrou suas atividades: “Terminamos em bons termos, e sempre dissemos que isso não é uma porta fechada, que voltaremos uma para a outra depois. Isso deu aos fãs um pouco de alívio. E mesmo sendo triste, fico feliz que nós anunciamos e ainda fizemos uma turnê inteira juntas, porque foi como uma celebração, e isso ajudou os fãs a também a dizer ‘oh sim, isso é uma coisa boa’”.
Jade também reconhece a influência do K-pop nessa mudança de mentalidade: “Eu acho que o K-pop também inspirou os fãs agora, para abraçar mais essas mudanças. Na cultura do K-pop, vemos muitas bandas de garotas que também fazem trabalho solo, mas elas ainda se unem, como o BLACKPINK, recentemente, e é legal, você pode fazer suas próprias coisas, e fazer as coisas do grupo”.
Colaborações Surpreendentes e Vídeos Marcantes
Como surgiu a ideia de aparecer no videoclipe do Fontaines D.C.? Você vê isso como uma declaração de que pop e o indie rock não estão tão distantes?
A colaboração nasceu de uma conexão criativa inesperada: “Nós dois tivemos o mesmo diretor de vídeo, o Aube Perrie, que é um dos melhores diretores de agora, eu diria, e foi ideia dele criar este multiverso”, explica Jade sobre sua participação em “Starburster”.
O elemento surpresa foi intencional: “Foi literalmente minha primeira aparição como artista solo. Amei que eu estava no fundo de um vídeo, e os fãs não tinham ideia. Quando o videoclipe do Fontaines surgiu, ninguém percebeu”, conta, rindo da estratégia que manteve fãs sem saber de nada por meses.
“Eu amei, e a ideia de ter easter eggs para os fãs, uma vez que eles percebram, eles estavam tipo, ‘oh meu Deus, ela esteve o tempo todo nesse vídeo há dois meses!’, Eu amei que era nosso mundo se unindo. Nós somos obviamente artistas muito diferentes, mas eu realmente sou uma grande fã do Fontaines D.C., eles são incríveis e foi legal que eles quiseram participar do meu vídeo também, e abertos à ideia de, sim, não apenas performar com outros artistas ou colaborar, mas há sempre novas formas divertidas de fazer isso, e não precisa necessariamente ser outro artista de pop”.
Como foi trabalhar com David LaChapelle?
A parceria com o lendário fotógrafo para “Fantasy” ainda parece surreal para Jade: “David LaChapelle é o grande moodboard para mim. Quando eu e meu diretor criativo começamos a juntar referências olhamos obviamente para o trabalho dele, um dos maiores fotógrafos e diretores de todos os tempos. Quando ele me disse que era fã e queria fazer algo juntos, eu literalmente perguntei ao meu estilista: ‘Esse é o verdadeiro David LaChapelle?’ Porque eu não podia acreditar”.
O resultado foi um retorno marcante do diretor aos videoclipes: “Ele não fazia videoclipes há 8 anos, e ele disse sim, vamos fazer. E eu realmente o respeitei por isso, porque obviamente não tinha um budget de Britney Spears naquela época, mas ele queria fazer porque queria me apoiar”.
A experiência superou todas as expectativas: “Eu realmente amo o vídeo de ‘Fantasy’, é tão diferente de ‘Angel’. ‘Angel’ foi tão extravagante, havia uma grande história, e um monte de vestidos, mas o que eu amo sobre ‘Fantasy’ é que, de novo, ela mudou a narrativa e surpreendeu as pessoas com o que estava vindo a seguir. E uma coisa que você vai receber de David LaChapelle é a melhor iluminação de beleza que você já viu em sua vida, e ninguém faz melhor do que David LaChapelle“.
SHOWBIZ BABY: Um retrato honesto da indústria
O álbum THAT’S SHOWBIZ BABY! é uma cutucada à indústria da música. Que lições sobre ela você quer transmitir?
O próprio título do álbum encapsula uma relação complexa e viciante com o mundo do entretenimento. “Quero transmitir o bom e o ruim. Sou viciada nisso, às vezes muito desesperadamente. Ser honesta sobre isso faz uma arte melhor”, explica Jade.
Essa honestidade se estende à própria experiência: “Tive experiências incríveis, tive algumas traumáticas, então é importante para mim ser honesta sobre isso, mas com um pouco de humor, sem ser tão desesperada”.
Que tipo de coragem leva para revelar vulnerabilidade em uma música como “Plastic Box”?
A faixa que explora ciúme e insegurança nos relacionamentos foi terapêutica para a artista: “Foi bem difícil com ‘Plastic Box’, foi uma das primeiras músicas que escrevi para o álbum. Escrevi quando conheci meu namorado, com quem ainda estou junto agora” Ela brinca: “ainda bem que funcionou como algo bom”.
Jade descreve o processo como catártico: “Eu sabia que queria alguma música de amor no álbum, mas não queria que fosse algo fofo e essa experiência de ciúmes, de irracionalidade, eu acho que está em todos nós. Foi uma espécie de terapia escrever essa música, e também senti que estava me confrontando, depois que olhava para as letras, eu ficava assim, ‘nossa!’. Meu namorado Jordan não era muito fã disso, porque pensava que era bem tóxico, e eu disse: ‘sim, é, e é por isso que deveria escrever’. Sinto que fui brutalmente honesta, e meu jeito de fazer isso é misturando tudo com essa linda, eufórica e feliz produção, com dança, mas quando você ouve as letras, você percebe… Essa é a vibe!”.

Parcerias que libertam
Como foi trabalhar com nomes como RAYE, Mike Sabath e Oscar Görres? Essa parceria influenciou sua identidade nessa jornada solo?
A escolha dos colaboradores foi estratégica para garantir liberdade criativa: “Foi muito importante para mim encontrar pessoas que me permitissem o espaço para ser muito honesta, e me sentir muito segura, mas também experimentar”.
Jade deliberadamente evitou fórmulas comerciais: “Não estava interessada em trabalhar com produtores ou escritores que dizem que a música tem que ser de determinada forma, tem que ser radio-friendly. Não estava interessada em jogar pelo seguro, porque já fiz muito isso”.
Sobre sua parceria com RAYE, Jade destaca a conexão especial: “Amo trabalhar com a RAYE, porque conheço ela há anos, e ela entende o que é ter experiências ruins na indústria, e como escrever sobre isso, então nos relacionamos muito”.
A química com os novos parceiros foi essencial: “Tentei não trabalhar com pessoas que trabalhei no Little Mix, só para me empurrar e desafiar para estar na sala com pessoas novas. O Pablo Borman que também trabalhou na produção ele é meio estranho, como eu, o que é bom, Mike Sabath é um espírito livre, eu amo trabalhar com ele, ele tem uma energia hippie, caótica, que me inspira. Me sinto atraída por esses personagens grandes, que não estão interessadas no que é o Top 40 agora, e que só querem criar algo”.
O resultado dessa abordagem foi liberador: “Acabei com músicas que me fazem sentir livre, não estão ligadas com o que funciona no TikTok, ou o que for, estou apenas fazendo coisas que realmente amo, e isso foi muito curativo e liberador para mim, especialmente para o primeiro álbum. Acho que isso pegou, as pessoas foram realmente receptivas a isso”.
O capítulo do renascimento
Quando você olhar este álbum em 10 anos, que capítulo da sua vida ele representará?
Para Jade, este momento marca uma transformação fundamental: “Essa é a era de renascimento. É autodescoberta, é um capítulo enorme na minha vida”.
A intensidade dos anos no Little Mix fica clara em sua reflexão: “Foi mais de uma década da minha vida, e foi tão importante para mim. Nada importou mais que o Little Mix, sempre veio primeiro, seja com relacionamentos, era minha família, e minha saúde mental às vezes. Realmente me consumiu, porque eu estava tão apaixonada pelo que éramos”.
Hoje, ela encontrou um equilíbrio mais saudável: “Sempre lembrarei desse primeiro álbum como o momento em que percebi que podia fazer isso sozinha, e fazer muito bem, estou muito orgulhosa. Agora posso amar a indústria da música e dar o meu melhor, enquanto também estar saudável, ter limites e manter relacionamentos queridos. É ok ter ambas as coisas”.
Mensagem para as próximas gerações
Se uma jovem mulher está passando por inseguranças ou enfrentando desafios na indústria musical, como todos esses que você descreve nas letras do seu álbum, que conselho você daria?
O conselho de Jade é universalmente aplicável: “Espero que ela tenha algum tipo de fonte para expressar isso. É tão importante, e não importa se você é famosa ou não, ou se está na indústria da música ou não, todos somos capazes de liberar essa energia”.
Como mentora natural, ela encoraja a força: “Espero que eu possa mentorar artistas no futuro e mostrar que é ok ser brava e afirmativa, e não se diminuir para outras pessoas. Especialmente agora, com as redes sociais, é tão inevitável nos compararmos”.

Com THAT’S SHOWBIZ BABY!, JADE não apenas se estabelece como artista solo, mas redefine o que significa crescer e evoluir na indústria musical, provando que às vezes é preciso se despir de tudo que conhecemos para descobrir quem realmente somos.
THAT’S SHOWBIZ BABY!, álbum de estreia solo de JADE, é um lançamento da Sony Music e já está disponível em todas as plataformas digitais.
O post O renascimento de JADE: ‘Descobri que posso fazer isso sozinha e fazer muito bem’ apareceu primeiro em Rolling Stone Brasil.